Praça Da Costa e Silva

28/12/2017

Teresina já entrava no final da década de 1970 e a região central ainda convivia com um “problema” urbano: a lagoa da Palha de Arroz. Tinha esse nome porque os piladores que trabalhavam na área depositavam nela cargas de cascas de arroz (Nota 1). Localizada praticamente na beira do Rio Parnaíba, se tornava um caos uma vez que suas águas transbordavam alagando boa parte do espaço ao redor.

O local mais afetado, sem dúvida, era a Avenida Maranhão que havia sido prolongada após a inauguração, em 1973, do prédio da CEPISA (Centrais Elétricas do Piauí S. A.). O fato é que a via, ao ser estendida, acabou barrando também o escoamento natural das águas da lagoa que jorravam por baixo.

Frame de vídeo do Arquivo Nacional mostrando uma vista aérea de Teresina em 1974.
Na imagem é possível ver a Lagoa da Palha de Arroz na região da futura Praça Da Costa e Silva.
(1974 / Arquivo Nacional / Acervo digital Teresina Antiga / Arte: Teresina Antiga)

Estava certo que a lagoa deveria desaparecer e, juntamente com ela, as casas de taipa ao seu redor. Embora o fator alagadiço fosse coerente, muito provavelmente pesou também o atraso que representava o acidente geográfico e as casinhas típicas de famílias de baixa renda em pleno Centro de Teresina. Em outras palavras, eram um elemento estranho ao progresso e àquele meio urbano.

Detalhe das casas de taipa ao redor
da Lagoa da Palha de Arroz na
região da futura Praça Da Costa e Silva.
No fundo a Avenida Maranhão, o Rio Parnaíba e a Ponte Metálica.
(1975 / Acervo Roberto Burle Marx / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)

A tentativa não era nova. A Prefeitura e o Governo do Estado já vinham criando pontilhões ou mesmo aterrando lagoas e grotões que impediam a locomoção urbana a exemplo do antigo riacho Barrocão, atual Avenida José dos Santos e Silva. Não havia consciência ambiental na época e o aterramento era algo comum de se fazer em várias capitais do Brasil tal como se fez ao longo do tempo em Belo Horizonte e São Paulo, por exemplo.

Projeto da Praça Da Costa e Silva.
(1976 / Acervo Roberto Burle Marx / Acervo digital Teresina Antiga)

Carlos Burlamarqui, então Secretário de Obras Públicas da gestão do governador Dirceu Arcorverde (1975-1979), propôs a construção de uma praça no lugar. Não só onde ficava a lagoa, mas em toda uma extensão de 20 mil m² que compreendia um quarteirão inteiro localizado entre a Avenida Maranhão, Avenida José dos Santos e Silva, Rua João Cabral e Rua Santa Luzia, às margens do Rio Parnaíba.

A projeto da praça foi obra de Acácio Gil Borsoi, arquiteto que planejou vários prédios da capital e o conjunto habitacional Mocambinho. Já o paisagismo foi elaborado pelo paulistano Roberto Burle Marx, mundialmente famoso e com diversas obras espalhadas por cidades no Brasil (Recife, Brasília, Belo Horizonte, São Paulo e Rio de Janeiro) e no exterior (Miami, Filadélfia, Caracas e Washington).

Praça Da Costa e Silva.
(1978 / Fundação Cultural Monsenhor Chaves / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)

É digno de nota o fato de que Burle Marx, na medida do possível, buscava manter a vegetação nativa em suas projeções, algo inovador quando se pensa que antes, para construir uma praça ou parque, se desmatava tudo e depois se replantava com árvores diversas. Por isso se vê ainda hoje no local algumas carnaúbas, embora tenha a presença de uma flora variada.

O nome do logradouro faz óbvia referência ao poeta piauiense Antônio Francisco Da Costa e Silva (Nota 2), nascido em Amarante em 1885 e falecido no Rio de Janeiro em 1950. Autor da letra do Hino do Piauí e com diversos poemas dedicados ao Parnaíba, nada mais justo que uma praça levasse seu nome ainda mais na beira do rio que tantos versos escreveu.

Postal da Praça Da Costa e Silva.
(s/d / Gilberto Mendes Farias / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: Tavares)

A obra foi realizada pela firma Lourival Parente. Segundo números oficiais, durou dois meses e foram necessários 460 homens trabalhando nos três turnos, 18 mil sacos de cimento adquiridos no comércio local, e aproveitados para o aterramento cinco mil m³ de pedras Piracuruca beneficiadas e gastos nove milhões de cruzeiros (Nota 3).

A praça já estava devidamente pronta no aniversário de Teresina, mas só foi oficialmente inaugurada em 5 de setembro de 1977 fazendo parte da semana de festividades da Independência do Brasil. Contou com a presença de 21 escolas públicas e particulares desfilando, cada uma, um tema do poeta Da Costa e Silva e diz-se que estavam presentes quase dez mil pessoas entre populares, políticos e empresários.

Aspecto da Praça Da Costa e Silva sem as grades de proteção.
(s/d / FUNDAC / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)

Inicialmente tornou-se um cartão-postal de Teresina sendo bastante movimentada por gente de todo canto da cidade. Banhistas do Rio Parnaíba aproveitavam a praça para mais um espaço de lazer nos finais de semana e anualmente se celebrava ali o Dia da Cultura (19 de maio) e o Dia das Crianças (12 de outubro). Seu espelho d’água formava uma cascata e os jatos jorrantes chamavam também a atenção, assim como o coreto. No memorial em homenagem a Da Costa e Silva, projetado por Gil Borsoi, constava uma pequena biografia do poeta e painéis com alguns de seus poemas escolhidos por Arimatéa Tito Filho, na época Secretário Estadual de Cultura.

Em outubro de 1980 já era anunciada uma reforma da área, fruto da ação criminosa dos vândalos. Na mesma década, o aspecto residencial das casas mudou para o comercial, pois muitas famílias venderam seus imóveis. Aos poucos as pessoas foram desaparecendo. A inserção das grades de proteção em 1993, junto com a violência, os vândalos e a conclusão das obras da Ponte da Amizade transformaram-na em um lugar abandonado e praticamente invisível para os teresinenses.

Busto do poeta Da Costa e Silva na praça em 2009.
(2009 / Acervo digital Teresina Antiga)

Em 6 de janeiro de 2009, um membro de nossa equipe tirou uma série de fotografias da Praça Da Costa e Silva para um trabalho universitário e já era possível ver os danos. Muitos lugares estavam pichados, os painéis deteriorados, água parada, a cascata ausente e, segundo relatos, muita fedentina.

Estava de pé ainda o busto do poeta, mas sua placa havia sido roubada. Até o fechamento desta matéria, quem passar pelo local verá que o busto já não está mais presente. Um de nossos maiores poetas não merecia tamanho descaso. Nem mesmo a própria praça que completou 40 anos em 2017 sem pompas e nenhuma reforma.

Pequena biografia com as obras de Da Costa e Silva na praça em 2009.
(2009 / Acervo digital Teresina Antiga)

Notas:

(1) Explicação segundo Iracilde Maria de Moura Fé. IN: LIMA, Iracilde Maria de M. F.. Teresina: Urbanização e Meio Ambiente. Teresina: Instituto Camilo Filho. Revista Scientia et Sapes, vol.1, n.2, 2002.

(2) Alguns desavisados equivocadamente grafam como Praça Costa e Silva como referência ao ex-presidente da República o militar Artur Da Costa e Silva. O erro aparecia até em algumas edições dos mapas de Teresina que vinham nas antigas listas telefônicas da extinta TELEPISA na década de 1990.

(3) Os dados constam em material publicitário da firma Lourival Parente na edição do Jornal O Estado, dia 16 de agosto de 1977.

Ajudaram para esta postagem:

# LIMA, Iracilde Maria de M. F. Teresina: Urbanização e Meio Ambiente. Teresina: Instituto Camilo Filho. Revista Scientia et Sapes, vol.1, n.2, 2002.

# LOPES, Wilsa G. R.; LEAL JR, José H. L.; MATOS, Karenina C.; BRITO JR., Nestor de C. No tempo e no espaço. Evolução da Praça Monumento Da Costa e Silva e suas relações com o entorno. Florianópolis: XIII Encontro da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional, 2009.

# LOPES, Wilsa G. R.; MATOS, Karenina C.; MATTARAIA, Regina A.; LEAL JR, José H. L.; VIEIRA, Geovana A. R.; COSTA, Nayane A. S. A presença de Roberto Burle Marx na cidade de Teresina, Piauí. IN: Teresina: Cadernos de Arquitetura e Urbanismo, v.21, n.29, 2014.

# O DIA. Edição do dia 28 de outubro de 1980. ARQUIVO PÚBLICO DO PIAUÍ.

# O ESTADO. Edição do dia 16 de agosto de 1977. ARQUIVO PÚBLICO DO PIAUÍ.