Pontilhão sobre o barrocão

25/7/2015

Até meados da década de 1960 a área central de Teresina ainda convivia bastante com os chamados barrocões, também conhecidos como grotões, grotas ou voçorocas. Antes de sua construção, a Praça Landri Sales (Praça do Liceu), por exemplo, era um imenso grotão chamado pelos populares de Baixa da Égua (Nota 1).

Os barrocões são depressões naturais e profundas do terreno com muitas pedras, plantas e um curso d’água. Com o advento da urbanização impediam a locomoção das pessoas e dos meios de transporte existentes como carroças e bicicletas. A solução encontrada foi a construção de pequenas pontes, inicialmente feitas de madeira.

Posteriormente, para abrir as ruas e os quarteirões e embelezar a cidade, os grotões ou eram aterrados ou eram canalizados e inseridas as coberturas. O aterramento de lagoas e cursos d’água é um grave atentado contra o meio ambiente e, não poucas vezes, tem como consequência os alagamentos provocando destruição e morte por onde passa. A prática não é mais aceita hoje em dia, mas é preciso lembrar que até as últimas décadas do século XX não existia uma consciência ambiental coletiva.

Na região da atual Avenida José dos Santos e Silva havia um conhecido riacho/grotão (Por esse motivo a via teve a denominação inicial de rua do Barrocão) (Nota 2). Um pouco antes de seu fechamento, se transformou em um esgoto a céu aberto com lamaçal e mau cheiro. As águas desse riacho “alimentavam” uma lagoa adjacente ao Rio Parnaíba: a Lagoa da Palha de Arroz (Aterrada e construída a Praça Da Costa e Silva em 1977).

Pontilhão sobre o barrocão
A estrada de terra é a Rua Barroso e o barrocão (Embaixo da ponte)
é a atual Avenida José dos Santos e Silva
(Década de 1930 / Arquivo Público do Piauí / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)

A imagem acima pertence ao Arquivo Público do Piauí. A estrada carroçável seria, segundo essa instituição pública, a Rua Barroso, e o barrocão que passa por debaixo do pontilhão de madeira seria a atual Avenida José dos Santos e Silva, que fazia parte de uma região maior conhecida como Baixa do Chicão (Nota 3). Se não fosse por essa informação ficaria muito difícil saber qual é esse lugar da cidade hoje. A foto por si só não dá subsídios para referências atuais, pois o espaço mudou totalmente com o passar dos anos.

A fotografia foi tomada visando focar a direção sul de Teresina, pois não se vê no horizonte nada que lembre a Praça Saraiva, a Igreja das Dores, o prédio do Diocesano ou qualquer evidência urbana existente nesse ponto. Talvez seja da década de 1930 tomando como referencial para esta afirmação apenas outras imagens similares da mesma época. A presença de duas pessoas provavelmente se deve a um recurso clássico que pretende mostrar a proporção do que é retratado (A vegetação abundante e a ponte) com a figura humana. Dessa forma se transmite aos demais uma perspectiva mais ou menos fiel do tamanho da edificação construída.

Próximo ao barrocão residiam pessoas em casebres de palha em condições deploráveis de vida e convivendo com um entorno degradado permeado de botecos e prostíbulos, enfim, esquecidos pelo Poder Público. Muitas dessas habitações de palha – principalmente da localidade Palha de Arroz – sofreram na década de 1940 com os incêndios criminosos que visavam afugentar para áreas mais distantes essa população miserável do centro de Teresina, longe dos olhos da elite residente em seus cômodos casarões.

Atualmente os casebres e o barrocão já não existem mais. Transformaram-se em uma área do Centro que em nada lembra o panorama de outrora.

Cruzamento da Rua Barroso com a Avenida José dos Santos e Silva
(Julho de 2015 / Acervo digital Teresina Antiga)

Notas:

(1)
O interventor Landry Sales construiu no lugar chamado Alto da Pitombeira (Foi edificado aí o Liceu Piauiense) uma pousada que descansavam os transeuntes que ali estavam de passagem com seus animais. Os jumentos, mulas, cavalos e éguas, por sua vez, descansavam e pastavam no terreno baixo, que era um riacho.

(2) Fazia parte, no século XIX, da Freguesia das Dores. Era uma rua bastante movimentada durante o dia, mas carente de calçamento e outras melhorias. Pelo decreto lei 144 de 1950 a antiga estrada do Barrocão foi oficialmente denominada em toda sua extensão de Avenida José dos Santos e Silva em homenagem ao comerciante e mestre de obras português que ajudou a edificar vários prédios da Teresina Imperial como o Mercado Público e a Igreja São Benedito.

(3) Iracilde Maria de Moura Fé Lima dá a Baixa do Chicão como sendo a atual Avenida José dos Santos e Silva com inclinação maior entre a Rua Rui Barbosa e a Avenida Joaquim Ribeiro. No cruzamento destas duas vias, segundo ela, havia uma ponte de madeira que ligava a área central à Vermelha, nessa época uma localidade fora dos limites urbanos de Teresina. Nota-se até hoje que o mesmo lugar é um terreno baixo que se prolonga até a uma pequena extensão da Avenida Barão de Gurgueia. IN: LIMA, Iracilde Maria de M. F.. Teresina: Urbanização e Meio Ambiente. Teresina: Instituto Camilo Filho. Revista Scientia et Sapes, vol.1, n.2, 2002.