Situação dos coletivos de Teresina na década de 1970

10/1/2018

Já na metade da década de 1970 apareceram várias notícias em Teresina sobre aquilo que muitos passageiros já sabiam na prática: o sistema de ônibus coletivo da capital era um caos e estava em crise. A cidade com então 300 mil habitantes em 1976, pedia por um transporte decente e digno de ser usufruído.

O antigo Departamento de Serviços Urbanos da Prefeitura fez os cálculos: dos 110 ônibus registrados um total de 100 estava circulando. Destes, grande parte estava em situação crítica: sujos e caindo aos pedaços ou, como diziam antigamente os teresinenses, um caiau.

Praça Marechal Deodoro: Usuários esperando para entrar em um coletivo urbano.
Antigamente, para ingressar nos ônibus se entrava pela porta traseira.
(1976 / Jornal O Dia / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)

Eram 18 linhas de coletivos nessa década, somando urbanas e rurais, nas mãos de poucas empresas como a Primavera, Gomes, Emtracol, Coimbra e Dois Irmãos. Muitas delas com apenas uma linha circulando em um bairro e em dois horários. Quem se atrasava tinha que voltar a pé. Não é à toa que caminhar de conjuntos habitacionais longínquos ao Centro e usar bicicleta eram um hábito citadino.

Muitos usuários reclamavam que demoravam a chegar. Eram constantes atrasos de uma hora e trinta minutos e até duas horas ou mais, em paradas sem proteção do sol escaldante. A sombra dos postes de energia servia de abrigo nessas ocasiões. Quando enfim chegavam, estavam superlotados. O jeito era ficar em pé durante boa parte do trajeto ou se dar ao “luxo” de esperar o próximo quando haviam bairros com mais linhas.

Avenida Frei Serafim: Usuários esperando pelo ônibus
e se protegendo do sol na sombra do poste de energia elétrica.
(1973 / Jornal O Dia / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)

Os empresários de transportes coletivos se defendiam argumentando que não recebiam incentivos oficiais e que o financiamento através dos bancos possuía juros muito altos que no fim das contas não compensava o investimento em nova frota. Reclamavam ainda da falta de profissionais (Motoristas e cobradores) e alegavam que a tarifa era barata e não cobria os custos com combustível e folha de pagamento. Falsos estudantes que deveriam pagar a passagem inteira completavam a lista de reclamações que sucateava o sistema.

O fato é que na década de 1970 boa parte dos teresinenses ganhava mal. Uns poucos cruzeiros que não dava muito nem para o sustento da família. Grande parte da população vivia na miséria habitando em casebres de palha, debaixo de pontes ou na rua mesmo, buscando água em rios, lagoas e chafarizes para si mesmo ou vendendo para adquirir uns trocados a mais. Não é de se admirar que muitos não tinham condições de pagar a passagem.

Praça Marechal Deodoro: Usuários esperando para entrar em um coletivo urbano.
(1976 / Jornal O Dia / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)

Os motoristas e cobradores também reclamavam da jornada extenuante e que as vias que transitavam estavam em péssimas condições, algumas verdadeiros carroçais principalmente as dos novos bairros. Fato agravado para eles quando se sabe que deveriam dormir nas garagens servindo de seguranças. Porém, os profissionais eram também acusados de freadas bruscas, de não parar em determinados locais e, quando paravam, não esperavam os usuários entrar.

Aspecto de parada de ônibus na Praça Marechal Deodoro.
(1976 / Jornal O Dia / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)

Os problemas foram lentamente se acumulando até que, em 1979, Teresina enfrentou um protesto relacionado aos ônibus coletivos. A pauta, na realidade, eram as passagens. O vereador José Soares de Albuquerque apresentou projeto de lei criando um passe estudantil o que, de acordo com o movimento estudantil da UFPI, eliminava na prática a meia passagem aos estudantes. No dia da votação da matéria aconteceram protestos na frente da Câmara Municipal, nessa época localizada no Centro exatamente em uma das esquinas da rua Eliseu Martins com a rua Barroso. Baderna, agressões de ambos os lados (Estudantes e policiais), trânsito interrompido e gás lacrimogêneo marcaram o episódio.

Assim como hoje, quando chegava a linha de ônibus era um tumulto na hora de entrar.
(1976 / Jornal O Dia / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)

Ônibus velhos, sujos, demorados, passagem cara, protestos, ruas em péssimo estado. Acompanhando várias histórias do período e visualizando as fotografias é incrível perceber como a situação é ao mesmo tempo velha e atual.

Tão é verdade que imagens recentes de pessoas se protegendo do sol escaldante de Teresina na sombra dos postes de energia elétrica circularam nas redes sociais e viraram piada em todo o Brasil. Algo bem antigo, na verdade, e que acontece também em outras capitais nordestinas.

Se tirássemos as imagens em preto e branco e apagássemos o ano e algumas cifras e circunstâncias, qualquer um acharia que se trata de uma notícia contemporânea.