As Diretas Já! em Teresina
18/3/2015 – Atualizado em 2/11/2018 e 2/10/2023
Se em 1964 marchou-se sem parar no país inteiro, seja apoiando as Reformas de Base de João Goulart, seja contra elas através da Marcha da Família com Deus pela Liberdade denunciando a ameaça comunista, de 1983 a 1984 também marchou-se sem parar por aqui. Dessa vez a população pedia eleições diretas para Presidente da República. Era o apogeu do movimento que passou para história como Diretas Já!, Movimento pelas Diretas ou, simplesmente, Diretas.
A Lei da Anistia, em 1979, permitiu que muitos retornassem. A vontade de escolher um representante nacional na Presidência da República mexeu muito com o sentimento popular dos brasileiros e comícios se multiplicaram em todo o país.
Manifestação no Centro de Teresina contra as eleições indiretas no Colégio Eleitoral.
(1984 / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: Raimundo Costa)
Favoráveis às Diretas estavam representadas as forças políticas que, mais tarde, estariam envolvidas em casos de corrupção no Brasil:
– MDB: nascido de dentro do Partido Comunista Brasileiro (PCB), deu origem ao PMDB, representante do chamado estamento burocrático cujo objetivo seria dominar a máquina política e administrativa do país e dela se aproveitar. Entre os representantes estavam Ulysses Guimarães, Fernando Henrique Cardoso e José Serra. Estes dois últimos, em 1988, fundariam o PSDB, ala da esquerda ligada aos socialistas fabianos (Fabian Society, traduzido literalmente como Sociedade Fabiana) que, assim como o MDB, emergiu do PCB;
– PDT: criado em 1979, da esquerda trabalhista e ligado à Internacional Socialista;
– PT: fundamentado no pensamento de ocupação de espaços de Antonio Gramsci, nasceu da Ação Popular, uma organização comunista criada em 1962 que através da Teologia da Libertação buscava subverter o Cristianismo.
O surgimento da Nova República foi uma trama desses grupos para se instalar no poder eternamente, apoiando um ao outro. A população brasileira não percebeu no momento o complexo e complicado jogo e naturalmente foi às ruas em todo o país. Em Teresina não foi diferente. A exemplo de outras cidades do Brasil, a capital piauiense também teve diversas manifestações, além de eventos importantes que as antecederam.
1. Praça Pedro II (1983)
Manifestação a favor das Diretas Já na Praça Pedro II.
(1983 / Acervo particular de Paulo Gutemberg / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: Paulo Gutemberg)
As maiores manifestações no estado do Piauí a favor das Diretas aconteceram em Teresina. A primeira foi em frente ao Palácio de Karnak no dia 26 de junho de 1983 reunindo em torno de 3 mil pessoas. Outras mais surgiram no centro da cidade, uma delas na Praça Pedro II e nas escadarias da Igreja São Benedito.
2. Grande comício da Praça do Marquês (1984)
Ulysses Guimarães fala ao público na Praça do Marquês.
(13 de fevereiro de 1984 / Acervo particular de Kenard Kruel / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)
A maior manifestação de todas foi a do dia 13 de fevereiro de 1984 na praça Marquês de Paranaguá, bairro Marquês, localizado na zona norte da capital piauiense. Ulysses Guimarães (PMDB), Luís Inácio “Lula” da Silva (PT), Doutel de Andrade (PDT) e o jornalista José de Freitas Nobre juntaram-se a outras lideranças políticas do Piauí naquele que foi maior comício a favor das Diretas Já! no estado. Mais de 20 mil pessoas acompanharam as falas dos presentes com direito a aplausos e gritos a favor do movimento.
Grande comício a favor das Diretas Já! na Praça do Marquês.
(13 de fevereiro de 1984 / Acervo particular de Kenard Kruel / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)
O grande comício do Marquês foi organizado pelo Comitê Estadual Pró-Diretas, formado por integrantes da sociedade civil organizada e outros mais como membros da OAB e do sindicato dos professores do Piauí (APEP). O grupo de docentes ficou responsável, entre outras coisas, de enviar telegramas aos parlamentares solicitando o apoio irrestrito à Emenda Dante de Oliveira. O jornal O Dia (Edição 26 de abril de 1984) dava a notícia de que o comitê organizou uma grande paralisação a favor das Diretas no dia 25 de abril de 1984 onde 3 mil professores se revezavam na sede do sindicato, no centro de Teresina, em uma vigília cívica acompanhando a votação que se fazia em Brasília.
Grande comício a favor das Diretas Já! na Praça do Marquês.
(13 de fevereiro de 1984 / Acervo particular de Kenard Kruel / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)
3. Chapas na eleição do DCE-UFPI (1983)
Chapa Viração que venceu as eleições do DCE da UFPI, em 1983.
Muitos dessa chapa integraram o Comitê Pró-Diretas no Piauí.
(1983 / Acervo particular de Luiz Carlos Rodrigues Cruz “Puscas” / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: Arnaldo Albuquerque)
O Comitê Estadual Pró-Diretas contou com a ajuda do DCE da UFPI (Diretório Central dos Estudantes da Universidade Federal do Piauí) através da chapa Viração, formada por partidários do PT, PC do B e simpatizantes, além de membros da chapa Espinho. Em 1983 havia ganho as eleições da entidade ao derrotar a chapa Travessia. Interessante que havia também uma chapa denominada Diretas nitidamente inspirada no movimento Diretas Já!. Tanto esta como as outras eram ligadas à esquerda, algo comum nas universidades brasileiras.
4. Lucídio Portela e Hugo Napoleão
Na época das Diretas o governador era Hugo Napoleão do Rego Neto, eleito por voto popular em novembro de 1982 (Primeiro pleito estadual depois do movimento de 1964) para o mandato 1983-1986. Ele e o ex-governador Lucídio Portella pertenciam à ARENA.
“Lucidão”, como era chamado, ficou conhecido por perseguir seus adversários, principalmente médicos, professores, sindicalistas de oposição ao seu Governo e outros servidores públicos do estado. Em gesto autoritário, ameaçava com cortes nos salários, transferências ou mesmo demissão de funcionários públicos que, ao seu ver, atrapalhavam seu mandato. Famosas também eram as suas rixas com Alberto Silva, seu principal desafeto político, e com o PMDB.
5. Estranha explosão da Kombi da APEP (1982)
Kombi da APEP supostamente atingida por explosivo.
(1982 / O DIA / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)
Durante as proximidades do pleito eleitoral de 1982, era dada uma estranha notícia em Teresina. No dia 11 de maio, por exemplo, O Dia afirmava com veemência que uma bomba havia explodido no Tribuna do Povo, jornal dirigido por Paulo de Tarso Tavares Silva – filho de Alberto Silva – de forte ligação com o PMDB e que fazia oposição ao governo estadual. Outra bomba foi descoberta dez dias depois em uma Kombi de propriedade da APEP, o sindicato dos professores do estado do Piauí. O órgão do magistério também fazia oposição ao governo Lucídio Portella tendo Wall Ferraz, inclusive, escrito depoimentos no jornal da entidade (Jornal do Professor).
6. Comício Pró-Tancredo (1984)
Multidão no comício pró-Tancredo na Avenida Antonino Freire.
(1984 / Acervo particular de Paulo Gutemberg / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: Paulo Gutemberg)
A Emenda Dante de Oliveira, como todos sabem, não passou. Consolidada a derrota, ainda em 1984 os brasileiros saíram às ruas para uma campanha favorável à eleição de Tancredo Neves à Presidência da República em oposição ao candidato Paulo Maluf, do PDS. Em Teresina, o comício pró-Tancredo ocorreu na Avenida Antonino Freire. Como é possível ver em uma das faixas da foto acima (“Hugo tancredou e o povo gostou“), o governador Hugo Napoleão havia cedido às pressões populares e políticas e declarou apoio ao candidato mineiro.
Tancredo Neves, inclusive, visitou Teresina, em outubro de 1984, para o comício e subiu o palanque com várias personalidades políticas do Piauí (Ciro Nogueira "pai", Alberto Silva, Hugo Napoleão etc.). Estava também presente o maranhense José Sarney, que assumiria mais tarde a presidência com o falecimento do político mineiro em 21 de abril de 1985.
Tancredo Neves no Piauí.
(1984 / Acervo digital Teresina Antiga)