Centenário de Teresina (1952)

22/8/2015

Celebrando o Centenário

Com as proximidades do seu primeiro Centenário, Teresina experimentou uma mudança significativa em seu espaço urbano. Já crescia lentamente se expandindo ao norte e ao sul e timidamente ao leste. A população, porém, se concentrava na área central perfazendo na totalidade da cidade (Zonas urbana e suburbana) quase 52 mil habitantes (Na área total do município eram mais de 90 mil), segundo o Censo Demográfico de 1950.

Centenário de Teresina: o Arco Triunfal na Praça Pedro II.
(1952 / SEMPLAN / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)

Foram implementadas para o grande evento algumas alterações físicas que se fixaram essencialmente no perímetro central. Exemplo disso é a reforma do Theatro 4 de Setembro e a inauguração ali ao lado do Bar Carnaúba pelo Governo do Piauí em parceria com a Prefeitura Municipal e administrado inicialmente pelo comerciante Raimundo Veras e famoso posteriormente sob o controle dos irmãos argentinos Osvaldo Fassi e Carlos Fassi.

Também sofreram reformas, principalmente no quesito ajardinamento – muito perceptível nas fotografias dessa época -, as praças Pedro II, Rio Branco e Saraiva, sendo que nesta última foi inserida às pressas uma estátua de José Antônio Saraiva. Foram inaugurados em 1952, na Zona Norte, a Avenida Centenário e o Sanatório Meduna, que na falta de um grande hotel serviu de hospedaria para os visitantes ilustres.

Aspecto da Praça Rio Branco, totalmente restaurada
visando as comemorações do Centenário de Teresina.
(1951 / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: Guilherme Müller) 

Mas a principal alteração foi a construção das torres pontiagudas da Igreja do Amparo iniciada em 1951 pelo padre Joaquim Chaves (“Monsenhor Chaves”) quem publicou também para as comemorações, através da Prefeitura Municipal, a obra Teresina – Subsídios para a história do Piauí (1952) referência nos estudos históricos e de costumes da capital.

Centenário de Teresina: o Arco Triunfal na Praça Pedro II.
(1952 / SEMPLAN / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)

Durante uma semana do mês de agosto de 1952 (De 16 a 23 de agosto), determinados espaços da capital ganharam a visita de inúmeras pessoas. O primeiro dia foi acompanhado de perto por O Cruzeiro, grande revista de circulação nacional na época. O Cine Jornal Informativo do Governo Federal registrou também imagens, mas estas em formato de vídeo. Nelas ficaram eternizadas um pouco da Missa Campal de Ação de Graças e dos eventos na Praça Pedro II. Uma verdadeira raridade sendo talvez um dos vídeos mais antigos da capital piauiense.

Outras solenidades deram continuidade ao momento festivo como as apresentações da banda da Polícia Militar do Piauí, a escolha da Rainha do Centenário, o memorável Arco Triunfal do Centenário na Praça Pedro II, e a disputa do Torneio Centenário de Teresina com a final realizada no dia da Independência do Brasil entre River e o Botafogo local, no Estádio Lindolfo Monteiro, com o placar de 3 a 2 favorável aos riverinos.

Centenário de Teresina no Cine Jornal Informativo.
(1952 / Agência Nacional / Governo Federal / Acervo digital Teresina Antiga).

Mantendo as aparências

O grandioso evento, porém, não alterou diversos problemas de infraestrutura básica. O abastecimento de água e energia elétrica eram precaríssimos. Muitas ruas eram sujas e ainda não tinham calçamento. Os moradores conviviam no período seco com a poeira e problemas respiratórios, e durante a época chuvosa com a lama e as enchentes. Lamentavelmente esses cenários ainda são visíveis nos dias de hoje.

Centenário de Teresina: o Arco Triunfal na Praça Pedro II.
(1952 / SEMPLAN / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)

Embora capital de estado e centenária, Teresina ainda mantinha traços de uma cidade provinciana como outras mais do interior do Brasil. Nada contra o provincianismo das cidades, mas sempre se espera mais da maior aglomeração de um estado da federação, fato este não verificado na Cidade Verde onde o progresso custava a chegar e atrapalhava o bem-estar social de muitos cidadãos que ainda conviviam com pobreza, miséria e enfermidades que foram erradicadas faz muito tempo em outros lugares.

Centenário de Teresina: Desfile na Praça Pedro II.
(1952 / SEMPLAN / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: Guilherme Müller)

Muitos teresinenses tinham como grande entretenimento o espaço da Praça Pedro II, as tertúlias no Clube dos Diários, os hábitos de frequentar a Igreja e bisbilhotar a vida dos outros. Outro costume interiorano, quase extinto na urbe, como bem lembra Arimathéa Tito Filho, era o das “senhoras carrancudas [que] só compravam galinhas soprando-lhes as penas e lhes apertavam o bico a ver se o gogo escorria”. Na Avenida Frei Serafim e outras vias e logradouros do Centro, os transeuntes e os poucos carros disputavam espaço com carroças e animais soltos como cachorros, cavalos, bois, galinhas e porcos embora um Código de Posturas de 1939 previsse a retirada deles ali.

Ao redor da área central persistiam os casebres de palha. Soma-se ao panorama paupérrimo da cidade a horda de miseráveis que perambulavam e pediam esmolas nas ruas. O alto número de analfabetos mostrava o desleixo governamental com a educação.

Inauguração do busto de Antonino Freire da Silva, ex-governador do Piauí.
Ao centro, em posição superior à multidão, discursa Simplício Mendes.
(1952 / Casa da Cultura / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)

Os acontecimentos em torno do Centenário mais pareciam uma maquiagem das inúmeras adversidades. O maquinário governamental, encabeçado pelo prefeito João Mendes Olímpio de Melo (UDN) e pelo governador Pedro de Almendra Freitas (PSD), teve importante papel na edificação das aparências urbanas para a festividade. Para isso se serviu de tributações especiais (A Taxa do Centenário) em cinemas e partidas de futebol, selos comemorativos com a imagem de Saraiva, e um auxílio de 5 milhões de cruzeiros vindo do Governo Federal.

Passado esse período de festas e de visitas ilustres como a de Assis Chateaubriand (Na época Senador, proprietário dos Diários Associados e da recém inaugurada TV Tupi), tudo voltaria ao normal. As fotografias das festividades, portanto, devem ser vistas sob um olhar suspeito uma vez que não correspondiam às dificuldades enfrentadas por boa parte dos habitantes.

Plantio da Árvore da Amizade por iniciativa do Rotary Club de Teresina e com a presença de populares e do prefeito João Mendes Olímpio de Melo.
(1952 / Acervo do IBGE / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)

Conflito de datas

O que pouca gente sabe é que poucos anos antes de 1952 não se sabia com exatidão qual era a data oficial para a comemoração do aniversário de fundação de Teresina. Entre 1941 e 1942 uma comissão de vários autores se debruçou para descobrir a “verdadeira história da cidade” e o 16 de agosto de 1852, dia que se comunicou às outras províncias a instalação da nova capital, foi apresentado como oficial e homologado em 1942 pelo Governo do Estado com o Decreto nº 611. Porém, em 1949, a Lei Municipal nº 107 fixou também como oficial o dia 21 de julho transformando-o em feriado. Com o choque de legislações, novos questionamentos emergiram e puseram em dúvidas o marco de fundação da capital. Só um ano antes do Centenário é que foi de fato considerado legalmente o dia 16 de agosto como o aniversário de Teresina através de projeto do vereador Artur de Araújo Passos após calorosos debates.

Centenário de Teresina
(1952 / SEMPLAN / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: Guilherme Müller)

Assim como as datas da Independência do Piauí, a escolha de uma “data correta” para o aniversário de Teresina gera até hoje debates apaixonados, inflamados, controversos, ególatras e polêmicos que advém dos inúmeros olhares, das mentalidades individuais e coletivas e do que cada sociedade aceita como “verdade”.

As escolhas para as datas remetem também ao lugar que iniciou a cidade, se na Vila Velha (Poty Velho) ou na Vila Nova (Largo do Amparo). Alguns políticos, cidadãos e até historiadores renomados creditam, ingenuamente ou estrategicamente, o Poty Velho como o início de Teresina. Tanto que em muitas ocasiões o aniversário da cidade fora ali comemorado com eventos e o tradicional corte do bolo. Uns vão mais longe e dão o distante ano de 1832 como marco de fundação da capital! Na verdade nesse ano o Poty foi elevado à categoria de vila. Como diz Paulo Gutemberg, “o marco zero da cidade se encontra na Matriz do Amparo […] e a denominação de ‘Vila Nova do Poti’ fora provisória e de uma impropriedade flagrante […] uma vez que se encontrava ao lado do Rio Parnaíba”.

Centenário de Teresina: o Arco Triunfal na Praça Pedro II.
(1952 / SEMPLAN / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d) (Clique na imagem para ampliar)

Para o bicentenário

As celebrações do Centenário não ficaram a dever. Estavam à altura da grandiosidade histórica que se presenciava naquele momento. Que o segundo Centenário, em 2052, a cidade não enfrente os mesmos problemas estruturais da década de 1950 e que insistem em permanecer neste limiar do século XXI.

Centenário de Teresina: Banda da Polícia Militar do Piauí.
(1952 / Site do Maestro Rocha Sousa / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)

PROGRAMAÇÃO DO CENTENÁRIO
NO DIA 16 DE AGOSTO DE 1952 (SÁBADO)


– 5h: Abertura das festividades na Praça Pedro II e na Praça Saraiva com o 25º B.C. e a Polícia Militar do Piauí.
– 7h: Desfile das tropas do Exército e da Polícia Militar do Piauí.
– 8h: Hasteamento da Bandeira Nacional em todos os departamentos públicos; Missa campal em Ação de Graças na porta da Igreja de Nossa Senhora do Amparo celebrada pelo bispo de Teresina Dom Severino Vieira de Melo; Sermão Gratulatório do Evangelho pelo Padre Joaquim Raimundo Ferreira Chaves.
– 9h30min: Inauguração da estátua de José Antônio Saraiva na Praça Saraiva.
– 14h: Sessão Magna na Câmara dos Vereadores.
– 15h: Inauguração do busto do Dr. Antonino Freire da Silva com discurso do desembargador Simplício de Sousa Mendes.
– 16h: Recepção e coquetel na Faculdade de Direito do Piauí em honra a Pedro Calmon e Deolindo Couto, respectivamente reitor e vice-reitor da Universidade do Brasil.
– 19h: Inauguração das reformas do Theatro 4 de Setembro; Conferência sobre a personalidade de José Antônio Saraiva.
– 20h: Baile em homenagem aos hóspedes ilustres e à sociedade piauiense no Palácio de Karnak.

Matéria da revista O Cruzeiro, preservada em vidro, destacando o Centenário de Teresina.
(1952 / Folheto de “O Dia – 160 anos de Teresina” / Acervo digital Teresina Antiga)

Ajudaram para esta postagem:

# MORAIS, Eliane Rodrigues de. A comemoração do Centenário de Teresina, um exemplo de práticas e representações. (Dissertação de Mestrado em História). Teresina: UFPI, 2010.

# SANTOS, Maurício Feitosa dos. Comemoração, pobreza e cultura letrada no Centenário de Teresina (Dissertação de Mestrado em História). Fortaleza: UFC, 2014.

# SOUZA, Paulo Gutemberg de Carvalho. A invenção de Teresina. IN: Teresina. Teresina: Pulsar, 2004.

# TITO FILHO, J. de Arimathea. Teresina. O Dia. 12 de setembro de 1990. ARQUIVO PÚBLICO DO PIAUÍ.